Palestra do Presidente Lang

quarta-feira, 21 de novembro de 2001. Atendendo convite feito pelo deputado paraibano Francisco de Assis Quintans, (PSDB-PB), o Presidente do CONFEA, Engº Wilson Lang, realizou palestra sobre a Transposição das Águas do Rio São Francisco, em 23 de novembro, na Assembléia Legislativa da Paraíba, em sessão especial intitulada "Água para Todos". Na platéia, deputados, secretários de Estado, militares, representantes de Organizações Não Governamentais, engenheiros e estudantes ouviram atentamente a exposição. Além de Lang, fizeram parte da mesa os deputados Nominando Diniz Filho (PMDB-PB), presidente da Casa; Francisco Jácome Sarmento, secretário de Meio ambiente e representante do governador; Gal. de Brigada Goldofredo de Jesus Corrêa, Comandante do 1º Grupamento de Engenharia e Construção; Leonardo Pereira de Assis, Promotor de Justiça; Engº Agrônomo Manoel Duré, Presidente do CREA-PB e o Engº Alberto Maia, Conselheiro Federal do CONFEA pela Paraíba. Com o auxílio de transparências, primeiramente Wilson Lang apresentou o CONFEA e falou das características que o diferenciam de outros conselhos profissionais, em seguida, falou do modelo de desenvolvimento brasileiro e, sobre a transposição das águas do rio São Francisco, Lang deixou claro sua posição favorável a obra e a capacidade da engenharia brasileira, não só de executá-la mas de resolver os possíveis problemas consequentes dela, como agressões ao meio ambiente. Veja a seguir, a íntegra da palestra. CONFEA: um Conselho diferente "O Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia é uma Autarquia Federal que tem por missão e responsabilidade, juntamente com os 27 CREAs, registrar, cadastrar e fiscalizar o exercício das profissões. Tem um conjunto multi-disciplinar de profissões, diferente portanto, da maioria dos demais conselhos. Não é possível compará-lo com a OAB, Conselho Federal de Medicina ou qualquer outro órgão. Primeiro, temos dentro dele 1009 profissões, que vão desde as tradicionais engenharia civil, agronomia, arquitetura, geologia, meteorologia e geografia até as novas engenharias, como por exemplo, de tecnologia limpa, engenharia da madeira, de horticultura, entre outras. É a tecnologia dividindo as profissões em diferentes áreas e, a cada dia, surgindo novas formatações que exigem, por sua vez, novas habilidades e uma visão geopolítica dessas profissões e do mundo econômico em que elas estão inseridas, cada vez mais apuradas e sofisticadas. Outra característica do CONFEA, é de ser multi-nível, coisa que não é encontrada nos outros conselhos, pois tem dentro do seu corpo, profissionais de nível superior, tecnólogos e profissionais de nível médio. O Conselho existe desde 1933, portanto tem uma história de 67 anos. Hoje, fazem parte dele 850 mil profissionais que não são encontrados em pontos de concentração, como por exemplo, advogados em fóruns e cartórios criminais, ou médicos em hospitais e centros de saúde. Os profissionais da área tecnológica são encontrados no centro da cidade de João Pessoa, construindo algum elevado ou vivendo 30 dias dentro de uma barcaça, pesquisando minerais em algum igarapé do Amazonas. Espalhados em milhões de quilômetros quadrados, onde você pode encontrar profissionais dessas áreas. O CONFEA é distribuído em 27 CREAS que têm formatações diferentes. O CONFEA tem cinco Comissões Sistemáticas. A composição dos CREAS é feita através da participação de associações de engenheiros, arquitetos, agrônomos, dos clubes de engenharias e das escolas. Portanto, o CREA é uma figura democraticamente constituída, com presidentes eleito por voto direto dos profissionais, da mesma forma que foi eleito o Presidente do CONFEA que aqui vos fala. Desenvolvimento brasileiro O desenvolvimento deste país foi ancorado em função Estado. Tudo aconteceu a partir de 1940, quando Getúlio Vargas deu efetivamente um impulso ao desenvolvimento brasileiro, na histórica negociação com os americanos e plantou as bases do sistema petroquímico, através da Petrobrás; da Vale do Rio Doce, com a entrada do setor de mineração e de tantos outros complexos industriais e só foram retomados, num segundo momento, com Juscelino Kubitischek, quando o país foi novamente transformado num novo vetor de desenvolvimento ancorado, dessa vez, em alguns outros pontos industriais, mas principalmente, baseado sobre rodas, sobre estradas. Um modelo de desenvolvimento muito diferente, por exemplo, da Alemanha, que centrou seu desenvolvimento sobre ferrovias e de outros países que centraram outros modelos de transportes. Por conta dessa função de Estado, 60% dos profissionais que fazem parte desse Conselho, e esse número já foi maior, vivem e trabalham para o Estado. E é muito simples entender porque: é o Estado que contrata estradas, aereoportos, diques, portos, barragens, hospitais, escolas e até quando, bem intencionado, viabiliza edificações para reduzir o gigantesco déficit habitacional, que ainda coloca mais de dez milhões de famílias em condições sub-humanas de moradia. Não pretendemos explorar na exaustão o assunto que vamos abordar, mas gostaríamos de conversar algumas questões que são fundamentais. A primeira delas é a vetorização do desenvolvimento brasileiro. Reversão necessária No nosso entendimento, o Brasil precisa praticar uma reversão do que nós chamamos de vetores estruturais de desenvolvimento. O país foi criado e desenvolveu, baseando suas estrada no sentido de Norte a Sul, percorrendo o litoral e com algumas transversais dando vazão à sua produção de leite, café, ferro, ouro... e este vetores, que são representados pelos poucos portos de grande porte que temos ao longo do Brasil, ao longo da Costa Leste, não têm a menor possibilidade de contribuir com todo segmento a Oeste que é o Brasil Central, cujas as fronteiras de desenvolvimento ainda estão sendo processadas. Então, quando alguém produz soja em Dourados no Mato Grosso, tem dificuldades de por essa soja no porto de Santos e fazer com que esse produto chegue aos mercados internacionais a preços competitivos porque ele não tem linhas de transportes para fazer isso. As linhas de transportes quando previstas, numa outra época, para outras coisas, outros produtos e uma dimensão de país que não tem nada a ver com o país que temos hoje. Ou seja, o país cresceu muito mais do que aqueles governantes puderam imaginar se é que, historicamente, imaginavam alguma coisa nesse sentido. Vamos ver ao longo desses 500 anos, como eu procurei rapidamente pontilhar, poucas coisas foram feitas para tanto tempo. O que estamos fazendo hoje, é conversar sobre uma questão muito simples: existe uma região neste país que não tem água e eu estou tratando de uma condição essencial de vida. Por outro lado, como vamos ver os índices, somos o país de maior malha hídrica do planeta. O país que tem, sozinho, a maior concentração de água doce e essa água doce, que é água potável não é para todos. Ela vai ser objeto de disputas judiciais, militares e já o está sendo em alguns pontos do mundo. E parece que alguns brasileiros querem fazer isso aqui dentro também. Então, é preciso que as idéias que vamos aqui expor transcendam a esta Casa, entrem na consciência das pessoas para elas entenderem o que de fato está acontecendo. Política de recursos hídricos Temos aí uma política nacional de recursos hídricos que foi recentemente implementada com a criação da Agência Nacional das Águas. Agora, o governo tem uma política, ou pelo menos, um instrumento político de gestão para tratar desses assuntos, porque questões legais, de recursos que não são de uns e nem de vários, mas que em determinados momentos são de toda uma coletividade, precisam de instrumentos modernos para serem geridos. A água do Brasil representa 12% da água doce do mundo, ou seja, o mundo inteiro quer a nossa água e nós, em função da internacionalização da nossa economia, em função das nossas relações com o mundo, temos que ter em mente que existe uma formatação estrutural de domínio, e esse domínio será exercido por quem tiver os instrumentos para tal. Portanto, se nós hoje temos 12% da água, da qual 68% está na bacia Amazônica, se não instumentarmos os vetores que temos na sociedade preparados para isso, a Amazônia como já foi dito em diferentes fóruns internacionais, passa a ser território internacional. A discussão será uma questão de força. Por isso, talvez tenhamos que também pensar em força. Não temos tradição bélica, as nossas forças armadas, deterioradas por políticas e gestões públicas sobejamente conhecidas, talvez precisem se equipar para dar um mínimo de condição de proteção a uma região que já é considerada território internacional. E isto está dito com toda clareza. O vice-presidente norte-americano, que neste momento está num jogo eleitoral, cansou de divulgar suas opiniões a respeito da internacionalização de terras estratégicas, e a Amazônia é uma delas. O Nordeste comparece a esta questão com 3% da água doce do país e o rio São Francisco aparece com 70% do Nordeste, vejam como ele é importante. O Velho Chico é chamado de Rio da Integração Nacional. Essa expressão precisa ser confirmada. Alguém tem que dizer para o Brasil que esse título não foi uma logomarca eleitoral . Do jeito que estamos nos comportando no Brasil, ele não está sendo Rio de Integração Nacional, pelo contrário ele está sendo o rio da desintegração nacional, porque se ele é um vetor de integração nacional pela geometria que apresenta, também passa a ser um agente responsável pelo desenvolvimento do que essa geometria representa. As iniciativas de desenvolver o problema do semi-árido começaram no século passado, portanto já estamos aí com mais de cem anos nessa história. O que demonstra com clareza, que algo está errado, porque alguém que passa cem anos conversando sobre um assunto e não o resolve tem algo errado. Não tem uma questão técnica para resolver, tem algum outro problema... Euclides da Cunha, personagem da história brasileira, falou muito sobre o assunto, mas só começamos a ter uma ação mais dinâmica na gestão do Presidente José Sarney. Rio privativo E aí, temos alguns dados interessantes para nós: uma bacia geográfica percorrendo sete Estados. Minas Gerais, Bahia, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Alagoas usam intensivamente o rio. Então, esse rio, aparentemente, é um rio privativo desses Estados. Ele abriga na sua bacia um pouco mais de 1,5 milhão de pessoas e responde por uma considerável área irrigada. Este rio tem uma gigantesca vitalidade de Sobradinho à Paulo Afonso, com a vazão média de água consideravelmente alterada após a construção de Sobradinho e de Xingó. Mas das cabeceiras até Sobradinho ele é um rio triste, com data marcada para morrer. Para constatar, basta alguns dos senhores pegar o mapa e sair andando e ver as condições do rio. E não foram as comunidades desses Estados que fizeram isso acontecer . É exatamente o Estado de Minas Gerais que consome um volume de madeira que se transforma em carvão para as usinas siderúrgicas do estado de Minas. E isso tem um preço, o desmatamento, a delapidação das riquezas da natureza tem um preço e esse preço terá que ser pago. Poderíamos aqui nos divertir com gráficos e outras coisas mais, mas o impacto da seca é muito simples de ser constatado. Se os senhores ficarem três dias sem beber água, saberão quais são os impactos da falta d'água. Podemos propor alguma coisa desse tipo para algumas figuras deste país. Cem anos de conversa O projeto é uma coisa complicada. Por quê? Porque faz cem anos que estamos conversando sobre esse tema, então provavelmente há cem anos o projeto era bem diferente do que é hoje, e com certeza, será bem diferente do que será daqui a dez anos. O projeto nunca será solução de tudo. Sempre que algum segmento da sociedade impor alguma condição para o projeto, é preciso que seja verificado em que tempo que ele está sendo feito. Talvez tenhamos nesse momento, o tempo tecnológico mais adequado porque a engenharia de construção brasileira detém nacionalmente algumas soluções. O projeto que hoje temos, desenvolvido pelos órgãos do governo e que ainda não está completo, precisa responder a algumas questões. O mais importante é que é um projeto, é um conceito que não está na cabeça das pessoas. As pessoas estão imaginando que nós vamos transpor o rio São Francisco, isso é o que está no imaginário popular. Então ,a primeira coisa que eu proponho é mudar o nome desse projeto. Nós temos que parar de falar em transposição do São Francisco, esta terminologia bate no imaginário e começa a construir uma idéia contrária. O que na realidade vamos fazer? Explicando de forma bem simples: vamos pegar um curso d'água, colocar dois tubos, puxar água e tocar para frente para atender a quem precisa dela. Tem algum problema nisso? Aí começam as perguntas sobre o projeto. A quem interessa o projeto? Pressupõe-se que esse projeto é o mais econômico do ponto de vista da desapropriação. Uma outra questão que vem sendo levantada, é de que vai haver um impacto ambiental e que o rio terá problemas. Então, todo mundo se esconde no conceito de que o rio vai ter problemas. Quando se fala nisso o CONFEA entende que essa história está mal contada. Nós estamos tratando de uma obra de integração nacional e nada que é mal contado pode avançar na sociedade de hoje. A sociedade de hoje quer transparência. As urnas eletrônicas mostraram, no país inteiro, que são eleitas as pessoas comprometidas com os anseios da população. Seminário O CONFEA fez um seminário sobre a transposição das águas do rio São Francisco, justamente com o objetivo de trazer à tona informações sobre o projeto. Ouvimos todos os órgãos governamentais envolvidos, organizações religiosas, não governamentais, todo mundo teve acesso ao microfone para dizer o que bem entendesse. E o resultado foi um livro lançado pelo CONFEA. A partir desse Seminário, nós entendemos que a engenharia brasileira domina completamente esse assunto. A engenharia brasileira tem condições de realizar a obra e resolver os problemas de impacto ambiental ou de qualquer ordem. Temos tecnologia para isso. Problemas ambientais Muitos dizem que o rio vai morrer. Eu diria que talvez esse projeto ou essa intenção de levar água para o semi -árido poderá ser a salvação do rio, porque será o momento em que organismos internacionais poderão dizer: finalmente temos um projeto sério para resolver o problema do rio. Por que que o rio está morrendo? Porque na Bahia se desmata indiscriminadamente, sem nenhuma função sustentável, levando madeira para as usinas siderúrgicas de Minas Gerais. É preciso que hajam as usinas, os carvoeiros? É claro que é preciso. Mas será que existe uma solução sustentada para isso? É claro que existe. De quem depende? Depende dos órgãos governamentais estaduais e municipais que existem. Estes setores não estão interessados em que o rio viva, se assim fosse estariam trabalhando em prol da sua sustentabilidade. É óbvio que temos que recuperar urgentemente as matas ciliares porque se não o fizermos agora, mais tarde não terá dinheiro para fazer isso. Estive em São Luis recentemente e lá tem rios que não se recupera mais, ou será que é isso que as forças querem? Será que querem que nós percamos o Rio de Integração Nacional para depois buscar recursos gigantescos e recuperá-lo? Ou será que a inibição de um processo desse que fatalmente vai fazer uma reversão do eixo de desenvolvimento brasileiro, não interessa para ninguém? As questões ambientais a engenharia ambiental responde e se ela ainda não o fez no papel, tem que fazê-lo. Porém se nós criarmos todo um grupo de dificuldades para não fazer aí é fácil. Questões energéticas O rio São Francisco é um gerador de energia. A afirmativa segundo a qual retirar 60 metros cúbicos de água por segundo lá no final pode, por daqui há dez anos, fazer com que o sistema energético brasileiro entre em colapso, deve ser de alguém que não entende nada de sistema energético. Não precisa ser especialista para entender isso. É muito simples. Por exemplo, a fábrica de alumínio em São Luis consome 659 megawats, este projeto que está aí com toda suas deficiências e possíveis erros, direcionado como está, vai usar 200 megawats, um terço de uma fábrica estrangeira que explora recursos minerais brasileiros e exporta sua produção. É uma questão estratégica. Precisamos deles? É claro que precisamos, fazem parte da nossa balança de pagamento. Porém, achar que 200 megawats, que é 1/3 de uma fábrica, achar que isso é significativo, deve ser brincadeira. Outro ponto que ainda trata do sistema energético, tem a ver com a história passada. Você tinha um complexo energético do Norte e do Sul. No Sul, um metro cúbico de água produz o dobro de energia de Paulo Afonso, por conta das suas declividades. Até o final do ano passado o Sistema não estava interligado, hoje a energia quer está aqui pode estar sendo produzida em Minas Gerais, em São Paulo, nós não sabemos. No instante em que se fez o linhão Tucuruí/Brasília o sistema se interligou, ou seja, se pode perfeitamente produzir 200 megawats, que é o pico de consumo daqui a dez anos. Posso produzir energia no Sistema Paraná e jogar no Nordeste sem dificuldades, dominamos a tecnologia de distribuição e integramos todo o sistema. Neste momento há necessidade de haver um entendimento tecnológico do que se chama de matriz integrada. As pessoas não podem esquecer que energia se faz com água. Quando eu digo que o Sistema hidrelétrico está integrado, eu digo que o sistema de água também está integrado porque o volume de água que passa em Paulo Afonso pode passar em Tucuruí ou em qualquer outra usina deste país. Se não bastasse isso, eu ainda tenho possibilidade de fazer energia com muitas coisas. Até com o desmatamento que a Bahia faz podemos produzir energia termoelétrica. Não se trata de ser a favor ou contra a transposição das Águas do rio São Francisco. Se trata de enxergar uma realidade diante dos vetores de desenvolvimento que hoje temos. Essa questão da matriz energética tem que ser bem posta. O gestor, o operador nacional do sistema elétrico acabou de dizer, semana passada, nos jornais, que o Brasil foi salvo pelas chuvas porque havia uma previsão de entrarmos em crise energética. O problema é estratégico e é de outra natureza. Se partiu do princípio que o desenvolvimento brasileiro se manteria nas taxas praticadas nos últimos 10 anos ou nos últimos 20 anos, que são baixas taxas, e por isso não se produziu energia. O que nos leva a concluir que o povo do semi-árido não tem nada com isso. Esse é um problema de geopolítica, estratégica de governo. A engenharia brasileira entende que se o Sistema de Energia está interligado, o Sistema de Água também vai ter que estar. É uma consequência natural. As transposições hoje existentes estão aí para comprovar isso. Essas transposições não deram problema nenhum. O único problema é a decisão política de mudar o eixo de desenvolvimento estrutural. Essa é que é a questão. Problemas da pesca Outro problema levantado é que o baixo São Francisco tem problemas com a pesca. As pessoas que moram nas áreas ribeirinhas, após Paulo Afonso, têm problema com a pesca, tem problema de sobrevivência. Isso é um problema do modelo econômico local. Não tem nada a ver com a transposição. Eles têm esse problema porque fizeram uma barragem e barragem não tem escada para peixe. Barragem é um elemento inibidor dos seus componentes sedimentares, dos sedimentos finos que são a parte básica da alimentação dos peixes. Se nós temos alguns milhões de pessoas no semi-árido com falta de água, então o Brasil inteiro tem que pagar a conta dessa turma. O Brasil inteiro tem que se solidarizar e pagar a conta desse pessoal para viver onde nasceram. Para eles terem o mesmo direito que todos os brasileiros têm de viver onde estão suas raízes porque é assim que se forma a cultura de um país. Falta de Planejamento A ausência de condições de vida do semi-árido e de outros setores do país, faz com que haja a migração, faz com que haja aqueles que vão para a cidade grande na busca não de melhores condições de vida, mas sim de condições de vida. Nós temos um problema de desenvolvimento e um problema de desenvolvimento não se traduz apenas por passar água onde tem um rio seco, a água é só o começo. Ali vão crescer negócios, as pessoas vão poder ter acesso a bens básicos, vão contribuir com o país, vão diminuir a pressão de imigração. O consumo de água parece que ainda não despertou as emoções de determinados segmentos da sociedade brasileira. Recife viveu recentemente momentos de grandes dificuldades. São Luis busca sua água potável a 80 quilômetros, Fortaleza a 450 quilômetros com a barragem do Castanhão, Pernambuco vai ter que buscar água, falta água no Estado. Se Recife fica hoje, no ano 2000, num racionamento de um para nove, imagina quando ocorrer uma seca, não será um para nove, será um para trinta, aí estaremos à beira de um colapso urbano. Existem certos momentos em que não se trata de defender grandes sobras de engenharia, mas em que o país tem que pensar daqui a 20 anos, daqui a 50 anos, ou seja, planejar a sua vida. E esse tem sido o grande problema neste país: nós não planejamos o nosso amanhã, temos dificuldades para fazê-lo porque a nossa natureza é muito pródiga. Nós temos sol todos os dias. Queremos deixar claro que em nosso entendimento, a questão não é a transposição das águas do Rio São Francisco, mas é uma questão estratégica, uma questão até militar, porque não será necessária só essa transposição, outras serão necessárias. E se as obras de engenharias serão feitas de forma tradicional com escavações, tubo, com bombas e etc, etc, vem aí o "tatuzão", uma grande máquina que vai abrindo buracos enormes debaixo do solo. Então temos tecnologia, o que nos leva a pensar que o problema não se trata da Bahia, não se trata de Minas Gerais, não se trata de contra ou a favor, se trata de um entendimento que os vetores de desenvolvimento do Brasil já não são os mesmos de 1940. As necessidades estratégicas do país já não são as mesmas que orientaram o desenvolvimento de 40 e de 60, são outras. E, portanto, nada mais oportuno que viabilizar que um pedaço do território do brasileiro possa ser integrada a esse esforço de desenvolvimento e de nova vetorização do crescimento. Sem água não há vida! Talvez, o nome dessa discussão não devesse ser transposição das águas do São Francisco, eu já ouvi aqui Água para todos, pode ser Nordeste Vida, Brasil Vida, porque os custos inerentes a este processo se deterioram dentro do crescimento orgânico que esse tipo de obra vai fazer e não é uma obra para amanhã, é uma obra para algum tempo. Fiscalização da sociedade Uma as discussões que foi feita no nosso Seminário e que nós ouvimos muito é que essa seria mais uma obra inacabada. Mas na minha opinião, essa história acabou. A sociedade não acredita mais nos mecanismos governamentais de controle porque eles não têm controle, essa é a verdade. Tivemos um exemplo disso recentemente. Fomos convidados pelo Presidente da República para participar de uma comissão para dizer o que fazer com uma obra de duas torres de 17 andares e 80 mil metros quadrados, que botou no bolso de alguns R$ 170 mihões (prédio do TRT de São Paulo). A sociedade não aceita mais mecanismo de controle imposto pelo governo. A sociedade quer participar. Recentemente, o CONFEA realizou seis audiências públicas no Brasil inteiro e entregou, sexta-feira passada na Casa Civil, propostas de mudanças que implicam no controle social, ou seja, existe um comitê técnico do governo que vai definir quem registra e quem não registra defensivos agrícolas. A sociedade não precisa mais povoar as galerias para fiscalizar os senhores, basta alguém com uma câmara jogar na internet e o mundo inteiro está assistindo os senhores. O sistema de fiscalização da sociedade moderna não é mais no grito, é visual, ela vê na tela. Por isso não acredito nessa previsão de obra inacabada. Só será se a sociedade quiser e eu tenho absoluta certeza que ela não quer. A sociedade que efetivamente está comprometida em mudar os destinos desse povo, deve assumir e comprar essa briga, se unindo com os segmentos realistas dos demais Estados para criar uma bancada parlamentar no Congresso Brasileiro e viabilizar esse projeto de transposição, para que as famílias não precisem se retirar de suas cidades e ocupar pontes nas grandes cidades, se somando a violência dos grandes centros urbanos. Se o Rio é de Integração Nacional, então vamos praticá-la, essa unidade precisa ser exercida e os senhores têm força política para tal".