Natureza jurídica quanto ao regime empregatício dos conselhos de profissões é tema de encontro no Confea

Brasília, 23 de julho de 2015

"Coordenador do Fórum de Profissões Regulamentadas, José Augusto Viana Neto; presidente do Confea, José Tadeu da Silva; coordenador do Colégio de Presidentes, Marco Antônio Amigo, e conselheiro federal Lúcio Ivar do Sul"

Celetista ou estatutário? Desde a década de 1990 se questiona, inclusive na Justiça, sobre qual o regime empregatício que deve se estabelecer quando se trata de contratações de pessoal nos conselhos de profissões regulamentadas existentes no país. Em busca da resposta, o Sistema Confea/Crea e Mútua, a partir de uma proposta feita por um de seus fóruns - o Colégio de Presidentes dos Creas -, abriu um dia em sua agenda para receber, ineditamente, na sede do Confea, em Brasília, presidentes de Creas e seus juristas, presidentes de vários conselhos de profissões regulamentadas, além de assessores e funcionários interessados, reunindo em seu Plenário cerca de cem participantes.

Abrindo os trabalhos, o presidente do Confea, eng. civ. José Tadeu da Silva, agradeceu ao coordenador do Colégio de Presidentes, Marco Antonio Amigo, pela solicitação do evento, que, “na verdade, foi uma contribuição”, disse. Segundo ele, os Regionais dos 30 conselhos federais de profissões regulamentadas somam cerca de 800 instituições – e todas passam pelo mesmo conflito. “Este é um problema muito sério, que coloca em xeque a existência dos conselhos de profissão. Se tivermos de aplicar o regime estatutário, não temos dúvida de que seremos transformados em agência reguladora e, com isso, perderemos a independência administrativa e financeira. Passaremos a ser um tribunal de ética profissional influenciado por questões políticas”.

"Advogado Cláudio Borrego Nogueira"

Primeiro palestrante do dia, o advogado pós-graduado em Direito Público, com experiência de 20 anos no Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo e agora funcionário do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo Cláudio Borrego Nogueira traçou um histórico teórico sobre a complexa legislação que rege o regime empregatício dos conselhos de profissões. A contextualização prática dos processos que o Confea enfrenta foi apresentada pelo subprocurador judicial do Confea, Demétrio Ferronato.

De forma didática, Borrego explicou os diversos posicionamentos dos órgãos fiscalizadores e judiciários. “A essência do problema dos conselhos é a definição de sua natureza jurídica. O regime empregatício é só a ponta do iceberg”, comentou. “Os conselhos, por essência, têm características que os divergem das demais autarquias. Essas peculiaridades não foram abordadas na Constituição de 1988”, completou. De acordo com sua apresentação, o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) é de que compete ao Estado não só legislar, mas também executar a fiscalização das profissões. O Estado delegou essa função aos conselhos, tornando-os autarquias autônomas. Já para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), os conselhos são autarquias corporativas de regime especial - ou seja - da administração pública indireta. Já para o Tribunal Superior do Trabalho (TST), os conselhos são entidades paraestatais e, por dotarem de recursos próprios, têm ampla autonomia financeira e administrativa e, inclusive, não precisariam fazer suas contratações por meio de concurso público. O Tribunal de Contas da União (TCU), por sua vez, estabelece que o concurso público é necessário e que os princípios constitucionais da administração pública devem ser atendidos pelos conselhos profissionais. Para Borrego, no entanto, o atendimento aos princípios constitucionais é estabelecido para o cumprimento das atividades da organização, não necessariamente para seus regimes de pessoal.

"Subprocurador judicial do Confea Demétrio Ferronato"

De acordo com o subprocurador judicial do Confea, Demétrio Ferronato, há 25 ações de funcionários e ex-funcionários solicitando a migração do regime celetista para o estatutário, tramitando em 1ª, 2ª e 3ª instância. Segundo seu entendimento, no momento de se elaborar a Constituição Federal, em 1988, e a Lei nº 8112/1990 - sobre o regime jurídico dos servidores públicos -, os legisladores não tinham em mente os conselhos profissionais. “Conselhos são tão específicos, que se o legislador ordinário quisesse incluí-los na [Lei] 8.112, teria sido mais explicito sobre isso”, comentou. Sua conclusão é de que a prática - o dia a dia de lidar com os processos dos conselhos - ilustra a ineficácia das decisões judiciais, que não analisam os casos de forma global, mas partem apenas da natureza jurídica dos conselhos que, no entanto, também causa divergência no Poder Judiciário.

Presente aos debates, Orlando Maia, representante do escritório do ex-ministro do STF Ayres Britto, lembrou que são os profissionais que votam em quem ocuparão os cargos dos conselhos. “Ora, submeter as contratações e criação de cargos à iniciativa estatal é, por fim, contra toda a estruturação democrática dos conselhos”, ressaltou.

Grupos

Os mais de 50 presidentes e advogados de Creas e do Confea dividiram-se em quatro grupos de trabalho para debater os principais problemas e soluções relacionadas ao tema. O presidente José Tadeu da Silva e o coordenador do Fórum dos Conselhos Federais de Profissões Regulamentadas, José Augusto Viana, destacaram a importância da mobilização dos participantes.

"Presidente do Crea-BA Marco Antonio Amigo e advogado Leonardo Montalvão"

Como proposta prática, o representante do grupo dos Creas da Região Sudeste, Crea-RN e Crea-BA, eng. mecânico Marco Amigo, coordenador do Colégio de Presidentes, e o advogado Leonardo Montalvão (Crea-RJ) destacaram a existência de quatro cenários de empregados dos regionais: servidores e empregados admitidos antes de 1988 (regidos pelo RJU), entre 88 a 97 (dentro do RJU apenas os concursados); entre 1997 e 2007, regime celetista, e a partir de 2007, RJU novamente. Ações junto ao Legislativo, ao Ministério Público Federal e à Casa Civil foram cogitadas.

“Há preceitos constitucionais envolvidos com risco iminente à questão financeira de todos os conselhos envolvidos. Uma das propostas a que chegamos é a de uma Ação Direta de Preceito Fundamental (ADPF), já que se trata de uma questão política em âmbito nacional. Consideramos que houve a concessão do RJU sem análise preliminar de fontes de custeio, o que poderia quebrar a administração de todos os conselhos”, discorreu Leonardo, lembrando que a ação deverá ser encaminhada por partido político, federações ou entidades como AGU e OAB. 

O presidente do Crea-RS, eng. civ. Melvis Barrios, relator do grupo dos Creas das Regiões Centro-Oeste e Sul, apontou a necessidade de esforços em torno de uma emenda constitucional ao artigo 39, a ser construída por meio de uma força-tarefa. “Essa ação poderia reunir um advogado por região, além do jurídico do Confea, e levada pelos 30 conselhos de profissões regulamentadas à Casa Civil”.

Já o relator do grupo dos Creas Nordeste, eng. civ. Leonides Alves da Silva Neto, conselheiro federal, apresentou uma relação de encaminhamentos. Entre eles, a proposta de contratação de dois escritórios renomados e com conhecimento notório sobre o assunto e que o Confea deve publicar um ato administrativo normativo para que os Creas saibam como tratar o assunto. “Irá ajudar os Regionais a proceder a contratação de pessoal e como lidar com as situações provenientes sobre o caso, com a apresentação de modelos de editais, por exemplo”.  

"Presidente do Crea-AM, Claudio Guenka"

O grupo da Região Norte propôs que o Confea crie maneiras de reduzir a vulnerabilidade atual dos Creas diante de cobranças frequentes do MPU quanto à imediata aplicação do RJU. “Em nosso debate, notamos que inúmeros Regionais estão impedidos de realizar processo seletivo simplificado de funcionários por conta da indefinição do regime de contratação”, comentou o coordenador do grupo e presidente do Crea-AM, eng. civ. Claudio Guenka. Também foi proposta reunião com a PGU, TCU, AGU e MPOG e uma maior articulação política com o STF, por meio do Fórum dos Conselhos Profissionais, para tratar do assunto.

Ponderação

“O trabalho terá continuidade, recebemos informações muito importantes. Todo esse material será objeto da pauta da próxima reunião do Colégio de Presidentes, dia 19 de agosto, em Maceió. E levaremos ao Fórum do Conselho de Profissões, em uma somatória de esforços. Temos que definir ações a curto e médio prazo. Entre elas, temos a questão de todos os 30 conselhos federais e seus respectivos regionais. Todos sob o mesmo conflito. E precisamos trazer estes atores importantes, como a AGU e outros. Nosso fórum tem um respeito muito grande desses órgãos. O chamamento de um conselho isoladamente é difícil até porque eles já tem uma posição formada sobre isso”, comentou o presidente do Confea, José Tadeu.

Já o coordenador do Fórum, José Augusto Viana Neto, destacou o histórico de atuação do grupo, em um processo de aproximação com a Casa Civil, a Advocacia Geral da União, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e, sobretudo, o Ministério Público Federal. “O Ministério Público tem o objetivo de defender o interesse público.  E nesse ponto o Ministério Público deixou clara sua intenção de fazer uma análise em que a sociedade seria beneficiada. Temos insistido na questão da autonomia financeira, para que não haja ingerência nos conselhos pelos partidos; e o ministério Público também aceita esta tese”. 

Ao agradecer a aceitação do convite do Colégio de Presidentes e ainda a proposta de voltar a debater o tema no próximo dia 19 de agosto, o engenheiro civil Marco Antônio Amigo destacou “as palavras ponderadas do coordenador do Fórum”, reconhecendo a importância de tomar medidas planejadas e, ao mesmo tempo, manter aberto o diálogo entre os jurídicos dos regionais e dos Creas. “Precisamos conseguir uma base jurídica para os regionais trabalharem”. 

Equipe de Comunicação do Confea