Tecnologia e inclusão: a engenharia como ponte para a autonomia humana

Vitória (ES), 7 de outubro de 2025.

Em um país com 14,4 milhões de pessoas com deficiência, a engenharia é aliada essencial na promoção do bem-estar, da autonomia e autoestima dessas pessoas. Foi com esse propósito que o painel “Inclusão na prática: como a engenharia influencia na vida das pessoas com deficiência” reuniu, na tarde desta terça-feira (7), profissionais da tecnologia, do ensino e setor público durante a 80ª Semana Oficial da Engenharia e da Agronomia (Soea), em Vitória (ES), para discutir soluções que tornam o mundo mais acessível e humano.

Logo na abertura do painel, o representante do Confea no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade), eng. civ. Daniel Faganello, salientou o compromisso institucional do Sistema Confea/Crea com a Agenda 2030 no sentido de promover acessibilidade, equidade e inclusão. “Estivemos no Fórum da Sociedade Civil da 18ª Sessão da Conferência dos Estados Partes da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (COSP18), na sede das Nações Unidas, em Nova York, EUA, em junho e nos comprometemos com a acessibilidade”, afirmou.

Em seu discurso na ONU, Faganello alertou para os desafios de adaptação das edificações já existentes, especialmente em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde limitações econômicas ainda dificultam as reformas necessárias à inclusão. Segundo ele, é urgente que governos adotem políticas públicas de incentivo, com linhas de financiamento acessíveis, juros reduzidos e suporte técnico, de modo a garantir às pessoas com deficiência o direito pleno à participação social, cultural e profissional.

Daniel Faganello

Engenharia: a medicina das construções
Enquanto pessoa com deficiência beneficiada diretamente pelas inovações da engenharia, a ativista e criadora de conteúdo Suzana Lima ressaltou que a área vai muito além da construção de obras e edificações. Para ela, trata-se de um campo que carrega a responsabilidade de desenvolver tecnologias assistivas capazes de promover acessibilidade, conforme previsto no artigo 74 da Lei nº 13.146, também conhecida como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.

A comunicadora frisou a importância da engenharia na vida cotidiana das pessoas com deficiência, definindo o campo como “a medicina das construções”, capaz de melhorar a vida humana de forma prática e garantir autonomia. “A engenharia é uma área abrangente que engloba outros campos e está se ampliando, com a inteligência artificial e a robótica. Destaco também as engenharias política e social capazes de promover projetos, planos e investimentos”, afirmou, convocando os profissionais a atuarem na redução de barreiras na sociedade. “Diversidade são as diferenças que somam. Inclusão é a participação que avança”, concluiu.

Suzana Lima

Soluções assistivas
Durante o painel, especialistas apresentaram soluções de sucesso voltadas à inclusão e à melhoria da qualidade de vida. Entre os projetos, destaque para a eletroestimulação funcional aplicada ao ciclismo. “A iniciativa consiste em utilizar eletrodos e equipamentos para injetar pulsos de tensão ou corrente elétrica para contração muscular”, explicou o eng. eletron. Roberto Baptista, coordenador do Projeto Empoderando Mobilidade e Autonomia (EMA) da Universidade de Brasília (UnB).

Roberto Baptista (terceiro da dir. p/ esq.)

Os resultados do projeto foram compartilhados pelo paratleta do Projeto EMA Estevão Lopes, que há dez anos faz uso da tecnologia assistiva após ter sido atingido por uma bala perdida em Brasília (DF), que o deixou paraplégico. “Ganhei qualidade óssea e massa muscular, minha circulação sanguínea melhorou, tive melhoria do condicionamento e mais autoconfiança”, relatou o atleta de alto rendimento, que representou o Brasil em mais de 30 países e em duas Paraolimpíadas. “Você que é engenheiro, muito obrigado por você ter ajudado neste projeto, nesta corrente do bem, neste compromisso de transformar a vida das pessoas”, disse, agradecendo também ao Confea pela oportunidade de estar participando da Soea.

Estevão Lopes

Outra experiência bem-sucedida compartilhada durante o painel foi o uso de tecnologia assistiva voltada à comunicação e à participação de crianças com deficiência múltipla não oralizadas, em decorrência da Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZV). O estudo foi apresentado pela vice-presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial (ABPEE), Márcia Pletsch, e investigou as concepções de profissionais da educação que atuaram com essas crianças nos anos de 2019 e 2020. Os resultados evidenciaram que o uso de recursos de tecnologia assistiva contribui significativamente para o desenvolvimento da comunicação, da interação social e do processo de escolarização, desde que haja apoio adequado, tanto no ambiente escolar quanto no familiar.

Márcia Pletsch

Já o eng. prod. Yves Carbinatti, secretário dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Rio Claro (SP), incentivou os profissionais de engenharia a transformarem conhecimento em soluções práticas para a sociedade. Vítima de um acidente de carro que o deixou em cadeira de rodas em 2008, Yves contou que definiu essa missão para ele mesmo ainda na faculdade. “Eu queria ajudar as pessoas com deficiência porque entendo que, nós engenheiros, devemos realizar melhores estudos e equipamentos para desenvolver a vida dessas pessoas”, contou, listando os avanços que a engenharia tem proporcionado ao longo do tempo. “Em 1930, as cadeiras de rodas tinham design tubular; em 1950 elas passaram a ser motorizadas; e atualmente elas ganharam mais conforto, segurança e autonomia, proporcionando mais qualidade de vida para as pessoas.” Segundo ele, o mesmo progresso é visível no campo das próteses, que deixaram de ser de madeira para se tornarem peças de fibra de carbono: mais anatômicas, leves e resistentes. “A engenharia é a solução para todos”, finalizou.

Yves Carbinatti


Reportagem: Julianna Curado (Confea)
Equipe de Comunicação da 80ª Soea   
Fotos: Sto Rei e Impacto/Confea