Brasília, 19 de novembro de 2025.

Há um ano, a Universidade de São Paulo (USP) iniciou a publicação de uma série de estudos interdisciplinares voltados à discussão de estratégias para o enfrentamento da segurança hídrica do país, diante das mudanças climáticas. A publicação Agenda Política Pública busca evidenciar experiências e ainda diretrizes de políticas públicas. Assim, preocupa-se em efetivar desde planejamentos para o enfrentamento dos desafios climáticos, entre temas como tecnologias sociais, governança e transição hídrica, a planos específicos para algumas bacias hidrográficas afetadas pela escassez hídrica – no Alto Tietê e também na região do Médio Paraíba, naquele estado.

O incentivo de ações políticas para a implementação das propostas se dá ainda por meio do uso de uma linguagem acessível. Financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Paraíba (FapesQ-PB), o projeto SEGHID – Segurança Hídrica reúne, além da USP, pesquisadores de diversas áreas da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), da Universidade do Vale do Paraíba (Univap), do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), da Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Entre eles, o engenheiro agrícola Salomão de Sousa Medeiros e a engenheira eletricista Vanessa Batista Schramm, ambos da UFCG.

“O projeto parte do pressuposto de uma governança adaptativa e da sustentabilidade para priorizar o desenvolvimento e a aplicação de tecnologias sociais (...) que promovem o empoderamento e diálogo com diferentes segmentos sociais, face às mudanças climáticas em contextos urbanos e periurbanos”, como descreve o site do SEGHID, grupo coordenado pelo cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi, que também lidera o projeto que deu origem às publicações, ao lado do bacharel em Direito José Irivaldo Alves Oliveira da Silva, da UFCG.

Entre várias atuações na USP, o pesquisador coordenou no Instituto de Energia e Ambiente (IEE) e integra sua Divisão Científica de Gestão, Ciência e Tecnologia Ambiental, o Grupo de Acompanhamento e Estudos em Governança Ambiental – GovAmb/IEE, grupo que também colabora com a elaboração de textos para a Agenda. A seguir, direto da COP 30, em Belém-PA, o professor do Programa de Pós—Graduação em Ciência Ambiental (PROCAM/IEE/USP) nos explica um pouco mais sobre a perspectiva transversal do projeto e das agendas.
Confea - Seu mestrado em Planejamento Urbano e Regional, pela Universidade de Harvard, com o tema “Avaliação de uma Política Habitacional e Alternativas para Ação Coletiva de Autoajuda”, completa 50 anos em 2026. E há 40, o senhor concluiu seu doutorado, falando de “Políticas Públicas de Saneamento Básico e Saúde e Reivindicações no Município de São Paulo 1974-1984”. Como o senhor percebe, ao longo dessas décadas, a evolução de uma interdisciplinaridade que pode ser exemplificada hoje em um grupo tão diversificado como o SEGHID e na sua participação na COP 30?

Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - Houve importantes avanços quanto à formação interdisciplinar desde o início da década na formação acadêmica e na pesquisa. Isto se reflete de forma muito concreta no perfil do conjunto de pesquisadores do projeto SEGHID, e na importância que o diálogo interdisciplinar assume na produção de conhecimento em torno da justiça hídrica na convergência com a segurança hídrica. A interdisciplinaridade potencializa a hibridização de conhecimentos e fortalece a compreensão mais abrangente de uma realidade que transcende a dimensão técnica e se amplia para uma perspectiva sociotécnica.

Confea - Fale então da sua participação e da sua expectativa para a COP.

Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - Minha participação se centrou em dois tipos de atividades: uma associada ao meu papel de presidente do Conselho América do Sul do ICLEI – Governos locais pela Sustentabilidade – com a moderação de mesas redondas no Pavilhão ICLEI/ONU Habitat, e a participação em debates sobre adaptação climática e transição energética justa. Outra atividade foi acompanhar debates no Pavilhão da Ciência em torno da emergência climática e da necessidade de redução de emissão de Co2, assim como de ampliação de diálogos dos cientistas, sendo alguns dos maiores climatologistas do mundo em torno da eliminação gradual dos combustíveis fósseis e do fim do desmatamento. A adaptação climática é um dos temas centrais e prioritários da COP 30, que ocorre em Belém do Pará. A presidência brasileira da conferência tem enfatizado a urgência de medidas de adaptação, considerando-as uma questão de sobrevivência diante dos eventos climáticos extremos. Mas é importante destacar também que a programação da conferência inclui dias temáticos dedicados a subáreas da adaptação, tais como: Cidades, Infraestrutura e Água, Resíduos e Governos Locais, Bioeconomia e Economia Circular. Os debates também incluíram temas como Justiça Climática e Inclusão, a garantia de acesso à informação e justiça ambiental, com um foco relevante na Amazônia.

Confea - As publicações fazem parte do projeto “Propostas de Diretrizes e Planos para a Governança e Segurança Hídrica Adaptativa: dimensões técnica, participativa e sustentabilidade num contexto de mudanças climáticas nas bacias hidrográficas do Alto Tietê e do Paraíba”. Como foi mesclar experiências com usos de tecnologias sociais e propostas de adaptação aos novos cenários, em evidência na Conferência das Partes da ONU sobre a Mudança do Clima?

Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - Foi uma tarefa muito desafiadora, notadamente pela importância que tem de assumir as tecnologias sociais associadas com inclusão social e equidade, fortalecendo as inovações como são as potencialidades das Soluções Baseadas na Natureza, na governança hídrica e como resposta necessária para atenuar os impactos dos eventos extremos.

Confea - As agendas têm uma linguagem acessível e bem de acordo com a forma como elas foram, em parte, produzidas, em diálogo com as populações envolvidas. Essa forma de valorizar as comunidades é bem recebida também pelos profissionais ligados às Exatas que integram o projeto? Como se dá essa convivência de universos acadêmicos tão distintos?
Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - A Agenda de Política Pública tem uma preocupação em fortalecer diálogos inter e transdisciplinares, tanto com a gestão pública, como com entidades da sociedade civil e organizações comunitárias nos territórios. Acredito que esta forma de comunicação tem um grande potencial de fortalecer diálogos e principalmente de aproximar os diversos atores sociais em torno da busca de respostas concretas aos problemas da governança democrática e sustentável da água.

Confea - Quais são as principais metas do SEGHID em um contexto de mudanças climáticas e como o senhor qualifica a importância dessa participação transversal dos profissionais da Engenharia?
Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - O SEGHID é uma proposta de pesquisa que buscou ampliar diálogos e aproximações em torno da segurança hídrica e aproximou profissionais com abordagem técnica dos que desenvolvem atividades de articulação social, formação e capacitação.

Confea - Como foram definidos os temas das 12 edições da Agenda Política Pública? O senhor acredita que elas poderão atingir a expectativa maior de contribuir para as políticas públicas do país em relação à segurança hídrica? Quais são os próximos passos?
Cientista social e economista Pedro Roberto Jacobi - A definição das 12 edições se deu de forma a possibilitar que os pesquisadores envolvidos pudessem apresentar seus resultados de forma interdisciplinar, abrangendo a diversidade de temáticas numa perspectiva hidrossocial, levando em conta as dimensões culturais, políticas, ambientais e territoriais na sua diversidade e múltiplas abordagens.

Henrique Nunes
Equipe de Comunicação do Confea
