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Engenheiro civil Darc Costa: apresentação sobre o desenvolvimento nacional antecipa debate do Congresso Nacional de Profissionais
Engenheiro civil Darc Costa: apresentação sobre o desenvolvimento nacional antecipa debate do Congresso Nacional de Profissionais

Brasília, 13 de setembro de 2022.

Uma prévia do 11º Congresso Nacional de Profissionais (CNP) às vésperas da sistematização das propostas que embasarão o evento. Assim pode ser considerada a apresentação “As Estratégias da Engenharia e da Agronomia para o Desenvolvimento Nacional”, do engenheiro civil Darc Costa, produzida pela TV Confea e disponível no YouTube do Confea desde a última segunda (12). Abordando o tema central (“Desenvolvimento nacional com implementação de políticas públicas para a Engenharia, a Agronomia e as Geociências”) e os três eixos temáticos do CNP (Infraestrutura; Inovação Tecnológica e Atuação Profissional), Darc descreve aspectos conceituais e aspectos estruturantes relacionados ao tema. 

O CNP será realizado de 6 a 8 de outubro, em Goiânia. A sistematização das 356 propostas aprovadas durante os Congressos Estaduais de Profissionais (CEPs), realizados de junho a agosto em todo o país, será feita nos dias 14 e 15 de setembro, no hotel Planalto Bittar, em Brasília. “O engenheiro é um profissional do desenvolvimento. A engenharia, basicamente, se lastreia pelo progresso. E o progresso resulta do desenvolvimento”, diz Darc Costa, ao início da conversa.

Mestre e Doutor em Engenharia de Produção pela COPPE-UFRJ, ex-vice-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e conselheiro do Centro de Estudos Estratégicos, Darc Costa é especialista em Estratégia Nacional e autor de livros como “Fundamentos para o Estudo da Estratégia Nacional”, “Estratégia Nacional: a cooperação sul-americana como caminho para a inserção internacional”, “Mundo Latino e Mundialização” (com Francisco Carlos Teixeira da Silva) e “América do Sul: integração e infraestrutura”. Com essa vasta experiência, Darc descreve sua visão sobre o ensino de Engenharia no Brasil, de hoje e do passado, além da importância de conhecer conceitos como infraestrutura e inovação, além do papel do Estado como agente indutor do desenvolvimento.

Universidade ontem e hoje
Ao apontar a criação de universidades nos Estados Unidos desde o século XIX e da Universidade de Berlim como um marco para o desenvolvimento europeu, em 1810, Darc Costa sustenta que, no Brasil, o grande marco foi a criação da Universidade de São Paulo, na década de 1930, representando um modelo educacional dos mais promissores experimentados pelo país, inclusive para a Engenharia nacional.
“Trouxeram professores da França como Michel Foucault e Claude Lévi-Strauss. A USP seguiu esse modelo francês. Mas depois ela sofreu influência da universidade americana e, ao fazê-lo, perdeu-se muito do que o engenheiro tinha na segunda metade do século XX no Brasil. Hoje, você especializou o engenheiro que perde a visão generalista, do antigo politécnico, retirando sua capacidade fundamental de ver o mundo. Ele passa a ver uma parte do mundo, mas não consegue preencher-se como engenheiro”, considera.


Segundo o engenheiro, na Universidade de Berlim, Humboldt considerava que o professor não é o simples acadêmico que ensina. “Ele é também investigador, pesquisador. Porque ele tem que estar na fronteira da arte do conhecimento para poder ensinar seus alunos”, diz, citando os estudos de Epistemologia e de Filosofia como outros marcos do ensino universitário alemão. “A base das ciências está na Filosofia”, lembra. “Isso foi tão exitoso que na constituição da nação alemã, a universidade teve um papel muito importante. Entre 1850 e 1930, a maioria das pessoas que marcaram as ciências do mundo eram alemãs”, diz, afirmando que o Nazismo e a Segunda Guerra interromperam esse status.

Em relação ao ensino a distância atual, Darc Costa considera que o mesmo retira a oportunidade da convivência com colegas que poderiam ajudar na absorção do conhecimento. “O professor não pode responder tudo. Muitas vezes, a experiência é adquirida no campo. Você aprende é com a prática. A teoria embasa, cria em você a capacidade de buscar a solução. O engenheiro busca a solução. Mas para fazer a solução progredir, ele precisa ter a prática. A teoria não traz isso, a teoria é o discurso. Então, quando você trabalha a teoria de uma forma que deixa o indivíduo na frente de um computador para aprender as coisas, ele vai aprender a teoria, pode ser até que seja um bom teórico, mas ele não terá a prática. Muitas vezes, eu peguei a prática com um colega de turma que também vivencia os mesmos problemas, então você minimiza a capacidade do indivíduo de resolver problemas porque ele fica restrito a ele mesmo e aos livros”, aponta, defendendo que a escola de Engenharia amplie seu campo de conhecimento e valorize a metodologia presencial. 

Darc Costa apresenta sua visão de soberania do país por meio da atuação da Engenharia
Especialista da área de desenvolvimento, Darc Costa apresenta sua visão de soberania do país por meio da atuação da Engenharia

Estratégia, inovação e progresso
Após uma breve conceituação de “estratégia” no contexto bélico, Darc considera que atualmente o conceito é entendido como uma característica da ação humana. “Toda intervenção sobre a natureza ou sobre outros homens exige estratégia. A Engenharia, a Agronomia estão presentes na intervenção sobre a natureza para servir o homem, para dar o bem-estar ao homem. O desenvolvimento é o modus operandi para o engenheiro praticar a sua profissão. Se não há desenvolvimento, não há engenharia. Se não há intervenção, não há engenharia”, comenta.

Darc acrescenta que toda intervenção depende do tripé interdependente Política (“O que fazer”), Estratégia (“Como fazer”) e Poder (“os meios a fazer”). “O engenheiro opera na parte referente ao como fazer e com os meios a fazer, com a estratégia e com o poder. Mas quem determina as coisas para o engenheiro é a política”, diz, para em seguida acrescentar que “o progresso é uma consequência da inovação porque a inovação é o espaço onde o novo aparece”.

Segundo Darc Costa, as empresas inovam para serem as donas do processo, ou seja, para não permitir que haja competição ou para ter uma maior produtividade. “Portanto, a inovação é a mola da acumulação. Ao inovar, você articula outras novidades que aquela inovação proporciona. É uma espécie de espiral positiva, de valoração dos bens que são produzidos. Então, o progresso também está preso à engenharia”, diz.


Se o engenheiro modifica a natureza, prossegue o especialista, ele o faz para que a natureza sirva melhor ao homem. “E, ao fazê-lo, ele cria o que se chama infraestrutura, modifica a natureza para proporcionar melhores condições de vida ao homem”, diz, dividindo-a em infraestrutura econômica (transporte, estradas) e social (escolas, hospitais). “O engenheiro e o engenheiro agrônomo é que fazem com que essa infraestrutura avance. A inovação, a infraestrutura e o desenvolvimento trabalham juntos, no sentido de fazer com que o progresso venha”.

Darc Costa considera que o preço deste progresso está relacionado ao trabalho do engenheiro que “tem que ser precificado pela capacidade que ele tem de construir um mundo melhor”, diz, considerando que a infraestrutura de saneamento é um exemplo de investimento econômico e social. 

O engenheiro civil aponta ainda o exemplo da descoberta de vacinas para esclarecer que não concorda com a distinção entre pesquisa básica e pesquisa aplicada. Para ele, “existe a pesquisa que busca a ciência natural pura e a pesquisa que busca uma aplicabilidade na vida cotidiana”. No caso da descoberta da vacina da varíola, diz, houve uma pesquisa básica que se transformou em uma pesquisa aplicada.

Planejamento, Estado e infraestrutura
Darc Costa considera que a busca pelo progresso requer planejamento. “O engenheiro tem que planejar a sua profissão. E o planejamento no Brasil se perdeu muito espaço. Hoje fala-se muito pouco em planejamento e desenvolvimento. E planejamento nada mais é do que rebater o triângulo indissolúvel que une política, estratégia e poder para o papel, respondendo aquelas três questões. O planejamento é fundamental para o engenheiro”.


Para ele, a infraestrutura brasileira é complexa. Fatores como a responsabilidade por vários atores, desde os níveis federal, estadual e municipal, à responsabilidade de diversos segmentos, por meio da Parceria Público-Privada, são apontados por Darc Costa. “A infraestrutura serve para irrigar mercados, integrar mercados e induzir a criação de um mercado novo. O Estado é fundamental para a indução porque ele gera o mercado quando faz uma artéria. Depois vai o povo para criar a riqueza possível. Então, temos que criar as condições para que o mercado se constitua, e só o Estado induz, o setor privado não faz isso porque no Brasil o setor privado se preocupa com o ganho de curto prazo, que não constrói processos”.


Setor industrial
Darc Costa afirma ainda que, além das atividades de engenharia e de infraestrutura, outro vetor do desenvolvimento é a indústria. “A indústria é o espaço onde se faz a acumulação. É na indústria que ocorrem as inovações. Elas ocorrem de forma muito mais rápida do que na atividade agrícola ou na mineração. E como a inovação é a mola da acumulação, o capitalismo funciona pelo fato de eu ser monopolista para que o meu custo marginal não seja igual à minha receita marginal, é necessário que a gente valorize a inovação, sabendo que normalmente essa inovação vai ser aplicada na indústria. 

No Brasil, diz Darc, o problema fundamental é que a maioria das indústrias são multinacionais. “Elas não criam centros de pesquisas aqui. Elas trazem o projeto de lá para vender aqui dentro. Diferente da Coréia do Sul, onde eles criam os projetos lá para vender fora. Então, temos um problema sério: os engenheiros aqui se tornam doutores e não encontram capacidade de aplicar seu processo porque não tem centro de pesquisas nas indústrias. Então, eles mergulham na atividade acadêmica, e sendo professor, ele vai se notabilizar por escrever textos, e não porque inovou. Por mais que ele seja competente, ele tem sua capacidade de construir restringida”, comenta, criticando também as premiações quantitativas dos papers. "Não é a tecnologia aplicada, ele não faz produto, então é estéril, ele fica falando para os alunos dele e nada se constrói de novo. Para resolver isso, é preciso ter empresa nacional. Com empresas estrangeiras, vai ser difícil colocar centros de pesquisa aqui. E a engenharia tem que brigar por isso”.

Henrique Nunes
Equipe de Comunicação do Confea