Alerta a engenheiros e arquitetos matogrossenses

Brasília, segunda-feira, 17 de dezembro de 2001. Nos anos 60, duas cidades de Mato Grosso eram grandes produtoras de algodão: Cáceres e Rondonópolis. Era um algodão de ótima qualidade, com produção, em grande parte, nas mãos de pequenos produtores. Este algodão era usado para vestir o povo de Mato Grosso. Hoje, Mato Grosso é o maior produtor de algodão do país e nosso povo está sem roupa. Cito este exemplo para pedir a todos os engenheiros e arquitetos de Mato Grosso que reflitam sobre o modelo de desenvolvimento que precisamos. Dia 11 de dezembro é a data do engenheiro e do arquiteto. O desenvolvimento necessariamente passa por uma das profissões relacionadas ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Crea), ou seja, o engenheiro e o arquiteto possuem papel preponderante no aconselhamento às autoridades sobre o modelo econômico e produtivo adequado. Poderíamos falar da soja, que engorda porcos na Europa e Ásia, enquanto não há comida para grande parte dos mato-grossenses. Mato Grosso é grande exportador. E, óbvio, todos sabemos que é preciso exportar para manter a balança comercial adequada ao desenvolvimento do país. Mas por que não conseguimos vislumbrar o retorno sócio-econômico dessa política de mercado externo? Desculpe-me o leitor, mas não faço parte do coro de otimismo cego que tanto temos visto em nosso Estado. O engenheiro e o arquiteto devem saber que, se temos hoje problemas terríveis em nossas cidades, é porque o modelo desenvolvimentista deste país está falido, por mais que haja merchandising apontando o contrário. Este modelo apontava que uma boa política de desestatização era imprescindível para que o Estado assumisse as suas obrigações constitucionais. Assim, o Estado vendeu quase tudo. E nossas universidades continuam quebradas, as escolas públicas estão deterioradas, os centros de saúde estão caóticos, o pronto-socorro está em situação lastimável, não há programa habitacional, não temos segurança para conversarmos na porta de casa e o apagão ronda nossa liberdade de consumidor. São só exemplos... Os profissionais da Engenharia e da Arquitetura lidam com o sonho social. Eles fazem casas, manejam florestas, controlam plantações, planejam usinas e adequam cidades. Porém, constantemente, se defrontam com decisões políticas que permitem o funcionamento de lugares insalubres, que favorecem projetos inviáveis por apadrinhamento, que optam pela luxúria em detrimento da racionalidade social que tanto precisamos. A questão é que a opção desenvolvimentista deste país historicamente nunca existiu de forma técnica, porque temos uma classe política que troca competência e responsabilidade por favores impublicáveis. Como presidente do Crea, convoco engenheiros e arquitetos a continuar gritando pelas soluções técnicas contra os desmandos políticos que naufragam com os sonhos dos pequenos produtores, com as necessidades dos cidadãos de periferia. Hoje, temos uma classe média que, ao olhar para cima, enxerga uma minoria rica e no poder curtindo férias em paraísos fiscais. Essa classe média é cada vez mais assaltada por tributos, sendo ela a responsável a subsidiar o Estado para que consiga ao menos manter os precários serviços sociais em prol da imensa maioria pobre e miserável deste país. O engenheiro e o arquiteto, em grande parte, fazem parte dessa classe média. São profissionais hoje sufocados pela ingerência política, pelos impostos abusivos, pela ausência de garantias econômicas, pela dificuldade de atualização profissional. O desenvolvimento sócio-econômico, em teoria, passa por eles. Mas a estrada desenvolvimentista acolhida por nossos políticos se perde nos palácios da demagogia. Finalizo, dando os parabéns do Crea a cada engenheiro e arquiteto que se dedica a lutar contra as incoerências sociais e econômicas de nosso país. Sátyro Phol de Castilho Engº civil e presidente do Crea-MT